segunda-feira, 2 de maio de 2011

O primeiro tiro certo

É de se estranhar, mas a história olímpica do Brasil - um dos países mais pacíficos do planeta, e famoso por grandes equipes e atletas de futebol e vôlei – teve início justamente com uma bala de revólver. O disparo certeiro de Guilherme Paraense, nas Olimpíadas da Antuérpia em 1920, abriu o caminho de conquistas olímpicas nacionais e escreveu uma das páginas mais curiosas da história dos Jogos.

Naquele ano, a equipe de tiro, uma das poucas a representar o Brasil em sua primeira participação nos Jogos, viajou de navio rumo ao continente europeu. Avisados de que não chegariam a tempo ao local dos jogos por vias marítimas, a tripulação decidiu desembarcar em Lisboa, de onde viajariam de trem até a Bélgica, com parada em Paris.

Após 27 dias, a delegação brasileira desembarcou na Antuérpia em condições precárias e, para piorar, teve seu equipamento roubado em uma das ferrovias. Os brasileiros só puderam disputar os jogos devido a um belo gesto da equipe americana, que em uma das maiores demonstrações de espírito esportivo emprestou suas armas a Paraense e seus companheiros.

E foi graças à solidariedade rival e à pontaria certeira de Guilherme Paraense que o Brasil conquistou sua primeira medalha em Olimpíadas, o ouro na categoria tiro rápido (25 metros). No desempate, o brasileiro foi o único a acertar um disparo na mosca e com 274 pontos, de 300 em disputa, subiu ao lugar mais alto do pódio aos 36 anos.

A equipe de tiro ainda conquistou duas medalhas, uma de prata, com Afrânio da Costa na categoria pistola livre de 50 metros, e uma de bronze, na mesma categoria, por equipe. Sem apoio financeiro, o time brasileiro não pode defender seus feitos nos Jogos de 1924, em Paris.

Apesar de ter entrado para a história como o primeiro herói olímpico do Brasil, Guilherme Paraense foi mais reverenciado na Europa do que em seu próprio país. Nascido em Belém do Pará, em 1884, viajou jovem ao Rio de Janeiro onde ingressou na Escola Militar. Baixinho, mas com bom porte físico, Paraense se destacava por suas habilidades em tiros curtos.

Além do ouro olímpico, conquistou também a primeira colocação nos Jogos Atléticos Sul-Americanos de 1922, além de seis campeonatos nacionais. Seu grande amigo e companheiro no esporte foi Afrânio da Costa. Apesar de seus incríveis feitos, Paraense não quis competir nos Jogos de 1932 e 1936.

O primeiro herói olímpico do Brasil ostentou sua longa barba branca até os 83 anos de idade, quando um certeiro ataque cardíaco o abateu no Rio de Janeiro, em 1968. O Brasil não conquista medalhas no tiro desde os Jogos da Antuérpia, marcados pelo drama da viagem, pela pontaria dos brasileiros e a solidariedade americana.

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